domingo, 20 de abril de 2008

Rapidinhas

Prelúdio Para Matar (Profondo Rosso; Dario Argento, 1975)

Prelúdio Para Matar é um filme de picos. Provavelmente atinge o casamento máximo entre imagem e som para construção de uma ambientação própria; de clima; de tensão. Cada seqüência de mistério, de investigação ou assassinato, sempre conduzidas como uma virgem suicida pelos acordes rasgados, gritantes e abusivos da trilha-sonora, consegue impressionar como poucas coisas já filmadas conseguem. É praticamente uma amplificação atmosférica de Império dos Sonhos, só que ainda mais brilhante nesse sentido. O curioso, porém, é o fato de a própria trilha-sonora parecer pontuar a pequena discrepância qualitativa de Prelúdio Para Matar – não simplesmente por esses momentos sem som perderem o mais fundamental atrativo do filme, eu acho. As cenas com a jornalista, por exemplo, parecem fazer parte de outro filme – ou estarem ali somente para dar vazão à troca de informações do protagonista com o espectador. Sem contar que o final a la Sexta-Feira 13 também decepciona – dava pra esperar algo bem mais ousado levando em conta a habilidade do Argento em construir toda a trama-sem-trama do filme. Aliás, levando em conta que o diretor parte do mesmo ponto de partida de Blow Up – é uma grande homenagem ao filme, aliás -, não tem como não comparar: a resolução do mistério e da brincadeira real/imaginário do Antonioni dá uma surra na do Argento, mesmo que naquele caso não seja a prioridade . Mas tudo isso não é suficiente para fazer de Prelúdio Para Matar um filme menos sensacional.

Os Homens Preferem as Loiras (Gentlemen Prefer Blondes; Howard Hawks, 1953)

O grande momento da carreira de Marilyn Monroe é Quanto Mais Quente Melhor, obra-prima da comédia sofisticada de Billy Wilder. Mas ninguém, nem mesmo Wilder no auge de sua genialidade, soube utilizar as principais características da persona cinematográfica de Monroe como Hawks neste divertido musical cômico de estúdio. O filme passa longe de ser uma das obras-primas do diretor, é claro, mas impressiona por fundamentar ainda mais um fato impossível de ser contestado: Hawks é tudo aquilo que Marc Foster queria ser, mas não vai conseguir jamais: um verdadeiro camaleão cinematográfico. O mais curioso, inclusive, é a consciência de Hawks ao tratar de seu próprio material, principalmente no que diz respeito à sua atriz – que ainda nem era o símbolo que seria anos depois, mas enfim. A principal característica de Monroe é transposta para o filme, raso, seco, todo colorido e exagerado, inegavelmente e plenamente construído em volta da ideologia da “dondoquinha fútil e mimada” que só pensa em homens ricos, dinheiros e diamantes. É quase um filme de porcelana. E o diretor, sabendo que extrapolou o tempo todo, ainda promove uma encenação de seu próprio universo ficcional no final – uma metalinguagem sem exteriores, inusitada, entre uma seqüência e o próprio produto. Mas a melhor coisa, de longe, é o personagem do nobre milionário inglês que, na realidade, é uma criança. Suas duas participações no filme são geniais – principalmente naquele que é o melhor momento do filme, quando Marilyn fica entalada na janela de uma cabine. Bobo, mas ótimo.

Os Corruptos (The Big Heat; Fritz Lang, 1953)

Estou começando a achar que o Lang deveria ter sido proibido de filmar noirs. Almas Perversas é uma das mais fundamentais obras-primas do estilo, todo sarcástico, amoral, recheado de personagens inescrupulosos e com o anti-herói mais anti-herói do mundo, por promover seu próprio fim pela burrice, pela inocência com a qual rege sua vida – Crime e Castigo não teria tanta densidade jamais. Os Corruptos, por sua vez, se prende ao universo da corrupção dentro das relações políticas de um município, seguindo aquela regra do filme policial da época, mas não deixando de lado a ironia pura e desmedida ao quebrar com a visão ainda em construção da ideologia que ficaria impregnada por longos anos no consciente social dos norte-americanos, o chamado American Way of Life. Na carona, Lang ainda constrói uma das mais intrigantes tramas do noir, evocando os principais elementos do estilo e procurando não transgredir, como fizera anteriormente, simplesmente posicioná-los de forma atraente. Além disso, ainda é ainda é um dos filmes que conseguem tratar de forma mais sincera sobre o ato da vingança, em especial pela consciência do protagonista de que a morte da esposa foi conseqüência de seu excesso de dedicação – e descontrole – na investigação que conduzia. É um filme bastante duro, lindamente fotografado e muito bem comprimido em seus 89 minutos, fato que poderia ter transformado filmes como Metrópolis, que o Lang fez ainda na Alemanha, no início da carreira, em obras-primas.

2 comentários:

Lucas Murari disse...

Lembrei de um filme essencial da década de 60 que nem eu e nem você citou, "Memórias do Subdesenvolvimento", obra cubana de 68, se não me engano. Li um livro que o diretor desse filme escreveu, "Dialética do espectador", ambos trabalhos são no mínimo geniais, pra não dizer revolucionários. Tem um artigo no livro muuuito fudido que ele compara as teorias de Eisenstein à Brecht. Vale a pena conhecer.

Daniel Dalpizzolo disse...

Interessante. Não tenho o costume de ler teoria cinematográfica, mas vou ver se consigo o livro pra dar uma olhada - nem que seja no artigo apenas, hehe.