quarta-feira, 19 de março de 2008

Scarface - A Vergonha de uma Nação (Howard Hawks, 1932)

Scarface conta a estória da ascensão de um ganancioso gângster dentro da guerra de máfias do início do século XX, nos Estados Unidos – passo semelhante ao dado pelo personagem de Al Pacino na magnífica refilmagem dirigida pelo mestre Brian de Palma, na década de 1980. Muito embora seja este o principal mote do filme, a incursão do maior coringa do cinema de Hollywood, Hawks, no submundo da máfia, seria apenas um singelo – porém extremamente pretensioso sob o ponto de vista moral, inclusive com uma abertura desastrada com letreiros incentivando o governo a combater a violência das ruas – e muito bem feito filme sobre as relações intrincadas entre os domadores da corrupção, com aquela visão típica do “the world is yours”, etc.

Entretanto, o que transforma Scarface em algo notavelmente maior, não em relação ao retrato apresentado por De Palma sob o ponto de vista descrito acima (que é muito, muito melhor mesmo), mas a ele mesmo, é aquilo que considero o principal e mais importante aspecto do filme: a relação entre Tony e sua irmã, que vai muito além da apresentada pelo Brian. Por que este Scarface original é incesto puro, do início ao fim. Pode transitar por outros não menos importantes (para o filme) viés, mas é como um bumerangue, sempre retorna ao relacionamento dele com a irmã. E a perspicácia de Hawks em insinuar todo o contexto subentendido da relação entre os dois (subentendido para eles mesmo, reforço) é de uma finesse única, genial.

Não bastasse tudo isso, pelo menos uns três planos apresentam uma composição visual tão absurda, mas tão absurda, que dá pra encher fácil fácil dois litros de porra da mais pegajosa enquanto se assiste ao filme. O primeiro, curiosamente, é o primeiro assassinato; fotografia fantástica, abuso das sombras, movimento de câmera fora de série. O segundo, uma das imagens mais icônicas de Scarface, é o homem caindo baleado sobre a sombra projetada de uma cruz sobre a calçada. O terceiro, meu preferido, é o fuzilamento de uma dezena de capangas em frente a um muro, com uma solução visual absolutamente genial, sem qualquer intromissão extra-diegética.

Pode estar um pouco distante de ser um dos melhores do Hawks (até porque, os três primeiros são obras-primas inigualáveis, absurdas, intocáveis e etc), ou até mesmo de proporcionar um espetáculo tão visceral e impressionante quanto a refilmagem de Brian de Palma (que, por sinal, vai muito mais além deste filme original, que mais parece um fiapo perto daquele), mas é ótimo mesmo assim. Ah, sem contar que é provavelmente um dos filmes com maior número de disparos de tiros que eu já vi, haha. É impressionante a quantidade de balas projetadas ao longo dos poucos 94 minutos da obra. Prato cheio.

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